terça-feira, 26 de maio de 2009

A teoria Espiral de Swanwick


O homem se desenvolve por etapas, antes da pronúncia do vocabulário, sons; antes da vida adulta, uma vida infantil e pré-adulta etc. O educador musical Keith Swanwick, organiza de acordo com sua experiência de prática docente, observação e acompanhamento de alunos de escolas de música inglesas, uma melhor maneira de perceber e analisar como se dá o desenvolvimento musical no ser humano. Sua idéia não é de forma alguma pioneira, tendo em vista que outros pensadores, educadores e psicólogos também organizam o desenvolvimento do indivíduo em etapas, aliás, quase toda a base teórica da pesquisa de Swanwick é de Piaget, pois, Piaget observa crianças em desenvolvimento, especialmente seus filhos e de forma geral. Swanwick então, organiza um método de observação e constatação de como a música se desenvolve na vida humana. Tentaremos entender de que forma então que Swanwick elabora suas pesquisa e teoria.
Keith Swanwick parte do princípio de que qualquer conhecimento obedece a etapas de acordo com o desenvolvimento psicológico de quem o estuda. Como a música também é um conhecimento como outro qualquer, Swanwick mapeia em diferentes faixas etárias (de 3 a 15 anos) o progresso deste conhecimento. Vale ressaltar que a pesquisa foi realizada com alunos de classes diferentes, etnias diferentes (desde asiáticas a africanas), durante quatro anos e o mais importante, trabalhando com a ótica da oficina de música, dando ênfase em defesa de uma série de outros educadores, dentre os quais, John Paynter e Murray Schafer, que trabalham com a “linha criativa” da educação musical, que explora a criatividade do aluno utilizando todo e qualquer tipo de material sonoro. Foram então analisadas 745 composições feitas por 48 alunos durante o tempo da pesquisa.
Por que teoria espiral? Ora, o gráfico estrutural do desenvolvimento musical os alunos observados é em forma de espiral. É através desse gráfico que Swanwick mostrou o desenvolvimento em níveis relacionados com a faixa etária dos alunos “compositores” estudados. Tais níveis ou territórios foram divididos em quatro: material, expressão, forma e valor.
O território material foi dividido em duas partes: sensorial e manipulativo que compreende a faixa etária de 0 a 4 anos; o território expressão diz respeito a cianças de 5 a 9 anos; o terceiro desses territórios, o da forma dividiu-se em duas partes: indiomático e especulativo relacionado a crianças de 10 a 15 anos; o quarto território, o do valor é dividido em duas partes: simbólico e sistemático e diz respeito aos alunos com 15 anos ou mais. Partindo deste esquema de territórios, Swanwick propõe um processo de aprendizagem batizado por ele de “C.L.A.S.P.”, que em português foi traduzido para a sigla “T.E.C.L.A.”. A idéia é de trabalhar os conteúdos de forma integrada, vinculada, favorecendo assim, o aprendizado integrado, de forma que, essas fases sejam vivenciadas com um vínculo contínuo entre elas.
Entendendo o significado de cada uma das letras da sigla T.E.C.L.A. entendemos melhor o que Keith Swanwick quer com sua teoria: dar subsídios de organização para uma educação musical sistematizada de forma que todos os elementos da sigla não sejam nem priorizados, muito menos, desprezados. Eis o significado:

T – Técnica (manipulação de instrumentos, notação simbólica, audição).
E – Execução (cantar, tocar).
C – Composição (criação e improvisação).
L – Literatura (história da música).
A – Apreciação (reconhecimento de estilos / forma / tonalidade / graus).

É importante dizer que a linha de “oficina de música” adotada por Swanwick, prioriza e enfatiza a livre experimentação em materiais sonoros, sejam eles instrumentos, objetos ou o corpo; apesar disso, ele recomenda que o aluno seja estimulado convivendo com músicas do seu dia-a-dia e dentro dos padrões musicais de sua cultura, o que não significa dizer que esse repertório não possa ser ampliado com outros campos sonoros, observando e respeitando o universo sócio-cultural e afetivo do aluno.
A preocupação do educador musical então, deve ser a de encontrar uma espécie de base comum entre música e educação musical de forma a tornar mais ativo o processo de aprendizagem do aluno. Segundo o autor, conhecer música não quer dizer escutá-la por acaso e sim, envolver-se com ela profundamente. Ensinando e aprendendo música, musicalmente.

Keith Swanwick em congresso

O Futebol é uma arte


Foto de Dirceu Maués

A História Educativa em Arte que temos

Recentemente li o texto. Considero de fundamental importância para conhecermos a história da Arte-Educação em nosso País.

1. A História Educativa em Arte que temos

• Determinantes sócio-culturais
• Tendências Pedagógicas na Educação em Arte
o A "Pedagogia Tradicional" e as aulas de Arte
o A "Pedagogia Nova" e as aulas de Arte
o A "Pedagogia Tecnicista" e as aulas de Arte

2. Que História da Educação Escolar em Arte queremos fazer

Transcrição do texto do livro "Metodologia do Ensino de Arte". Maria Heloísa Ferraz e Maria F. de Resendi e Fusari. Cortez, 1993.

Determinantes sócio-culturais

As práticas educativas surgem de mobilizações sociais, pedagógicas, filosóficas, e, no caso de arte, também artísticas e estéticas. Quando caracterizadas em seus diferentes momentos históricos, ajudam a compreender melhor a questão do processo educacional e sua relação com a própria vida.
No Brasil, por exemplo, foram importantes os movimentos culturais na correlação entre arte e educação desde o século XIX. Eventos culturais e artísticos, como a criação da Escola de Belas Artes no Rio de Janeiro e a presença da Missão Francesa e de artistas europeus de renome, definiram nesse século a formação de profissionais de arte ao nível institucional. No século XX, a Semana de 22, a criação de universidades (anos 30), o surgimento das Bienais de São Paulo a partir de 1951, os movimentos universitários ligados à cultura popular (anos 50/60), da contracultura (anos 70), a constituição da pós-graduação em ensino de arte e a mobilização profissional (anos 80), entre outros, vêm acompanhando o ensino artístico desde sua introdução até sua expansão por meio da educação formal e de outras experiências (em museus, centros culturais, escolas de arte, conservatórios, etc.).
Isto nos faz ver que as correlações dos movimentos culturais com a arte e com a educação em arte não acontecem no vazio, nem desenraizadas das práticas sociais vividas pela sociedade como um todo. As mudanças que ocorrem são caracterizadas pela dinâmica social que interfere, modificando ou conservando as práticas vigentes.
Dentre as mais relevantes interferências sociais e culturais que marcam o ensino e aprendizagem artísticos brasileiros podemos destacar:
a. os comprometimentos do ensino artístico (desenho) visando a uma preparação para o trabalho (operários), originado no século XIX durante o Brasil Imperial e presente no século XX;
b. os princípios do liberalismo (ênfase na liberdade e aptidões individuais) e o positivismo (valorização do racionalismo e exatidão científica), por um lado, e da experimentação psicológica, por outro, influenciando na educação em arte, ao longo do século XX;
c. o caos, os conflitos, os tecnicismos e a dependência cultural delineados no ensino de arte após a implantação da Educação Artística nas escolas brasileiras na década de 70 (Lei de Diretrizes e Bases 5692/71)
d. a retomada de movimentos de organização de educadores (principalmente as associações de arte-educadores), desde o início dos anos 80;
e. a discussão e a luta para inclusão da obrigatoriedade de Arte na escola e redação da Nova Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional, após a Constituição Brasileira de 1988;
f. a retomada das investigações e experiências pedagógicas no campo da arte; sistematizações de cursos ao nível de pós-graduação;
g. as novas concepções estéticas da arte contemporânea modificando os horizontes artísticos e conseqüentemente a docência em arte;
h. os debates sobre conceitos e metodologias do ensino de arte realizados em caráter nacional e internacional, a partir dos anos 80.
A preocupação com a educação em arte tem mobilizado pesquisadores, professores, estetas e artistas, os quais vêm procurando fundamentar e intervir nessas práticas educativas. No Brasil, desde o final dos anos 80 têm-se divulgado inúmeros trabalhos desta ordem, tanto aqueles elaborados aqui quanto os de outros países. São propostas que refletem atuações em arte e são baseadas:
a. nas necessidades psicológicas dos alunos ou em suas necessidades e problemas ambientais, comunitários e sociais;
b. no ensino e aprendizagem pensado a partir da própria da própria arte, como um sistema de conhecimento do mundo; no conhecimento da arte advindo de fazer artístico e também da apreciação e história da arte;
c. nas articulações dos atos perceptivos e verbalizadores dos alunos como base da experiência estética;
d. nos alcances e limites da interdisciplinaridade e entre os diversos métodos de ensinar a aprender os conhecimentos em arte;
e. nas necessidades de mudanças da formação do educador em arte, visando à melhoria da qualidade de escolarização desde a infância.
A História que estamos considerando, portanto, é aquela que está sendo desenvolvida por professores e alunos em suas práticas e teorias pedagógicas. E, observando a história do ensino artístico, percebemos o quanto nossas ações também estão demarcadas pelas concepções de cada época. Para este estudo apresentaremos uma síntese das tendências pedagógicas mais influentes no ensino de arte e sua relação com a vida dos brasileiros.

Tendências Pedagógicas na Educação em Arte

Com a criação da Academia Imperial de Belas artes no Rio de Janeiro, em 1816, tivemos entre nós a instalação oficial do ensino artístico, seguindo os modelos similares europeus; nessa época, a maior parte das academias de arte da Europa procurava atender à demanda de preparação e habilidades técnicas e gráficas, consideradas fundamentais à expansão industrial. Aqui, como na Europa, o desenho era considerado a base de todas as artes tornando-se matéria obrigatória nos anos iniciais de estudo da Academia Imperial. No ensino primário o desenho tinha por objetivo desenvolver também essas habilidades técnicas e o domínio da racionalidade. Nas famílias mais. abastas as meninas permaneciam em suas casas, onde eram preparadas com aulas de música e bordado, entre outras.

A "Pedagogia Tradicional" e as aulas de Arte

Nas primeiras décadas do século XX o ensino de arte, no caso, desenho, continuou a apresentar-se com este sentido utilitário de preparação técnica para o trabalho. Na prática, o ensino de desenho nas escolas primárias e secundárias fazia analogias com o trabalho, valorizando o traço, o contorno e a repetição de modelos que vinham geralmente de fora do país; o desenho de ornatos, a cópia e o desenho geométrico visavam à preparação do estudante para a vida profissional- e para as atividades que se desenvolviam tanto em fábricas quanto em serviços artesanais.
Os programas de desenho do natural, desenho decorativo e. desenho geométrico eram centrados nas representações convencionais de imagens;. os conteúdos eram bem discriminados, abrangendo noções de proporção, perspectiva, construções geométricas; composição, esquemas de luz e sombra. Nas Escolas Normais os cursos de desenho incluíam ainda o "desenho pedagógico", onde os alunos aprendiam esquemas de construções gráficas para "ilustrar aulas".
Do ponto de vista metodológico, os professores, seguindo essa "pedagogia tradicional" (que permanece até hoje), encaminhavam os conteúdos através de atividades que seriam fixadas pela repetição. e tinham por finalidade exercitar a vista, a mão, a inteligência, a memorização, o gosto e o senso moral. O ensino tradicional está interessado principalmente no produto do trabalho escolar e a relação professor e aluno mostra-se bem mais autoritária. Além disso, os conteúdos são considerados verdades absolutas.
A partir dos anos 50, além do Desenho, passaram a fazer parte do currículo escolar as matérias Música, Canto Orfeônico e Trabalhos Manuais, que mantinham de alguma forma o caráter e a metodologia do ensino artístico anterior. Ainda nesse momento, o ensino e a aprendizagem de arte concentram-se apenas na "transmissão" de conteúdo reprodutivistas. desvinculando-se da realidade social e das diferenças - individuais. O conhecimento continua centrado no professor, que procura desenvolver em seus alunos também habilidades" manuais e hábitos de precisão, organização e limpeza.

A "Pedagogia Nova" e as aulas de Arte

A "Pedagogia Nova", também conhecida por Movimento da Escola Nova, tem suas origens na Europa e Estados Unidos (século XIX), sendo que no Brasil vai surgir a partir de... 1930) e ser disseminada a partir dos anos 50/60 com as escolas experimentais. Sua ênfase é a expressão, como um dado subjetivo. e individual em todas as atividades, que passam dos aspectos intelectuais para os afetivos. A preocupação com o método, com o aluno, seus interesses, sua espontaneidade e o processo do trabalho caracterizam uma pedagogia essencialmente experimental, fundamentada na Psicologia e na Biologia.
Diferentes autores vêm marcando os trabalhos dos professores de Arte, no século XX, no Brasil, firmando a tendência da "Pedagogia Nova", Entre eles destacam-se John Dewey (a partir de 19(0) e Viktor Lowenfeld (a partir de 1939), dos Estados Unidos, e Herbert Read (a partir de 1943), da Inglaterra, Com a publicação de seu livro Educação pela Arte (traduzido em vários países), Read contribuiu para a formação de um dos movimentos mais significativos do ensino artístico. Influenciado por esse movimento no Brasil, Augusto Rodrigues liderou a criação de uma "Escolinha de Arte", no Rio de Janeiro (em 1948), estruturada nos moldes e princípios da "Educação Através da Arte":

Estava muito preocupado em liberar a criança através do desenho. da pintura. Comecei a ver que o problema não era esse, era um problema muito maior. era ver a criança no seu aspecto global, a criança e a relação professor-aluno, a observação do comportamento delas. o estímulo e os meios para que elas pudessem, através das atividades, terem um comportamento mais criativo. mais harmonioso.
As crianças vinham cada vez mais, e as idades eram as mais diferentes. Felizmente, tínhamos duas coisas muito positivas para um começo de experiência no campo de educação, através de uma escola. A experiência era feita em campo aberto, e a diferença de idades também foi outra coisa fundamental para que eu pudesse entender, um pouco, o problema da criança e o da educação através da, arte. Deveríamos ter um comportamento aberto, livre com a criança; uma relação em que a comunicação existisse através do fazer e não do que pudéssemos dar como tarefa ou ensinamento, mas através do fazer e do reconhecimento da importância do que era feito pela criança e da observação do que ela produzia. De estimulá-la a trabalhar sobre ela mesma, sobre o resultado último, desviando-a, portanto, da competição e desmontando a idéia de que ali estavam para serem artistas
(Depoimento de Augusto Rodrigues, 1980, p.34.
As palavras de Augusto Rodrigues podem sintetizar as idéias da Escola Nova, que via o aluno como ser criativo, a quem se devia oferecer todas as condições possíveis de expressão artística, supondo-se que, assim, ao "aprender fazendo", saberiam fazê-lo. Também, cooperativamente, na sociedade.

A "Pedagogia Tecnicista" e as aulas de Arte

A "Pedagogia Tecnicista", presente ainda hoje, teve suas origens partir da segunda metade do século XX, no mundo, e a partir de 1%0/ 1970, no Brasil.
Na "Pedagogia Tecnicista", o aluno e o professor ocupam uma posição secundária, porque, o elemento principal é o sistema técnico de organização da aula e do curso: Orientados por uma concepção mais mecanicista, os professores brasileiros entendiam seus planejamentos e planos de aulas centrados apenas nos objetivos que eram operacionalizados de forma minuciosa. paz parte ainda desse contexto tecnicista o uso abundante de recursos tecnológicos e audiovisuais, sugerindo uma "modernização" do ensino. Nas aulas de Arte, os professores enfatizam um "saber construir": reduzido aos seus aspectos técnicos e ao uso de materiais diversificados (sucatas, por exemplo), e um "saber exprimir-se" espontaneístico, na maioria dos casos caracterizando poucos compromissos com o conhecimento de linguagens artísticas. Devido à ausência de bases teóricas mais fundamentadas, muitos valorizam propostas e atividades dos livros didáticos que, nos anos.70/80, estão em pleno auge mercadológico, apesar de sua discutível qualidade enquanto recurso para o aprimoramento dos conceitos de arte.

Que História da Educação Escolar em Arte queremos fazer

Ao lado das tendências pedagógicas tradicional, escolanovista e tecnicista, surge no Brasil, entre 1961/1964, um importante trabalho desenvolvido por Paulo Freire, que repercutiu. politicamente, pelo seu, método revolucionário de alfabetização de adultos. Voltado para o diálogo educador-educando e visando à consciência crítica, influencia principalmente movimentos populares e a educação não formal. Retomado a partir de 1971, é considerado nos dias de hoje como uma "Pedagogia Libertadora", em uma perspectiva de consciência crítica da sociedade.
A partir dos anos 80, acreditando em, um papel específico que a escola tem com relação a mudanças nas ações sociais e culturais, educadores brasileiros mergulham em um esforço de conceber e discutir práticas e teorias de educação escolar para essa realidade. Conscientizam-se de como a escola se configura no presente, com vistas a transformá-la rumo ao futuro. E nos convidam a discutir as ações e as idéias que queremos modificar na educação em arte, como um desafio c compromisso com as transformações na sociedade.
Começa a se "desenhar" um redirecionamento pedagógico que incorpora qualidades das pedagogias tradicional, nova, tecnicista e libertadora e pretende ser mais "realista e crítica. Suas concepções podem ser sintetizadas nos seguintes aspectos:
(...) agir no interior da escola é contribuir para transformar a própria sociedade. Cabe à escola difundir os conteúdos vivos, concretos, indissoluvelmente ligados às realidades sociais. Os métodos de ensino não partem de um saber espontâneo, mas de urna relação direta com a experiência do aluno confrontada com o saber trazido de fora, () professor é mediador da relação pedagógica - um elemento insubstituível. É pela presença do professor que se torna possível urna "ruptura" entre a experiência pouco elaborada e dispersa dos alunos, rumo aos conteúdos culturais universais, permanentemente reavaliados face às realidades sociais (Cenafor, 1983, p. 30).
A educação escolar deve assumir, através do ensino e da aprendizagem do conhecimento acumulado pela humanidade, a responsabilidade de dar ao educando o instrumental para que ele exerça uma cidadania mais consciente, crítica e participante. Tem-se buscado elaborar, discutir e explicitar: então, uma "Pedagogia-Histórico-Crítica" (Saviani, 1980), ou seja, uma prática e teoria da educação, escolar mais realista, mais "Crítico-Social dos Conteúdos" (Libâneo, 1985) sem deixar de considerar as contribuições das outras perspectivas pedagógicas. Essa pedagogia escolar procura propiciar a todos os estudantes o acesso e contato com os conhecimentos culturais básicos e necessários para uma prática social viva e transformadora.
Uma pedagogia que leve em conta esses objetivos, no dizer de Dermeval Saviani, valorizará a escola; não será indiferente ao que ocorre em seu interior; estará empenhada em que a escola funcione bem; portanto, estará interessada em métodos de ensino eficazes. Tais métodos se situarão para além dos métodos tradicionais e novos, superando por incorporação as contribuições de uns e de outros. Portanto, serão métodos que estimularão a atividade e iniciativa doa alunos, sem abrir mão, porém, da iniciativa do professor; favorecerão o diálogo dos alunos entre si e com o professor, mas sem deixar de valorizar o diálogo com a cultura acumulada historicamente; levarão em conta os interesses dos alunos, os ritmos de aprendizagem e o desenvolvimento psicológico, mas sem perder de vista a sistematização lógica dos conhecimentos, sua ordenação e gradação para efeitos do processo de transmissão-assimilação dos conteúdos cognitivos.
Não se deve pensar, porém, que os métodos acima indicados terão um caráter eclético, isto é, constituirão uma somatória dos métodos tradicionais e novos. Não. Os métodos tradicionais assim como os novos implicam uma autonomização da pedagogia em relação à sociedade. Os métodos que preconizo mantêm continuamente presente a vinculação entre educação e sociedade. Enquanto no primeiro caso professor e alunos são sempre considerados em termos individuais, no segundo caso, professor e alunos são tomados como agentes sociais (Saviani, 1980, pp. 60-61).

Libâneo (1985) também contribui para este "desenhar" do novo redirecionamento pedagógico, ressaltando a natureza do trabalho docente hoje, no qual "um saber, um saber ser e um saber fazer pedagógico" devem "integrar os aspectos material/formal do ensino e, ao mesmo tempo, articulá-los com os movimentos concretos tendentes à transformação da sociedade".
Percebendo a relevância de conhecer o processo histórico do ensino de arte e nele saber interferir com consciência, Ana Mae Barbosa apresenta-nos importantes análises e sínteses nessa área, em seus livros Arte-Educação no Brasil (1978), Recorte e Colagem: Influências de John Dewey no Ensino da Arte no Brasil (1982), Arte-Educação: Conflitos e Acertos (1984), História da Arte-Educação (1986), O Ensino da Arte e sua História (1990). Preocupada com a democratização do conhecimento da arte (isto é, com a necessidade de assumirmos o compromisso de ampliar o acesso da maioria da população aos domínios estéticos e artísticos, por meio de uma educação de qualidade), Ana Mae contribui com relatos e reflexões que podem conduzir nosso trabalho de professores a posicionamentos mais claros. Ela considera fundamental a recuperação histórica do ensino de arte para que se possam perceber "as realidades pessoais e sociais, aqui e agora e lidar criticamente com elas". Essas idéias aparecem nitidamente em todos os seus livros, que nos convidam a discutir e encontrar formas de ação na atualidade.
Uma das ações que está em processo, hoje, e que vem se afirmando por sua maior abrangência cultural, refere-se a um posicionamento teórico-metodológico, conhecido entre nós por "Metodologia Triangular". Esta proposta, difundida e orientada por Ana Mae Barbosa, e que está sem dúvida interferindo qualitativamente no processo e melhoria do ensino de arte, tem por base um trabalho pedagógico integrador de três facetas do conhecimento em arte: o "fazer artístico", a "análise de obras artísticas" e a "história da arte". Este trabalho vem sendo desenvolvido e pesquisado, desde o início dos anos 90, em São Paulo, no Museu de Arte Contemporânea da USP (MAC-USP) e no sul do país, pela Fundação lochpe e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), dentre outras instituições de ensino.
Acreditamos que a consciência e a interferência sobre o processo educativo (e, neste caso, mais especificamente, de arte) é fundamental para o professor, para os alunos de Magistério, enfim, para todos que estão envolvidos com uma educação que se pretende transformadora. A consciência histórica e a reflexão crítica sobre os conceitos, as idéias e as ações educativas de nossa época possibilitam nossa contribuição efetiva na construção de práticas e teorias de educação escolar em arte que atendam às implicações individuais e sociais dos alunos, às suas necessidades e interesses, e, ao mesmo tempo, proporcionem o domínio de conhecimentos básicos. da arte.
O compromisso com tal projeto educativo exige um competente trabalho docente. No caso da ação educativa em arte com crianças, o professor terá de entrelaçar a sua prática-teoria artística e estética a consistentes propostas pedagógicas. Em síntese, é preciso saber arte e saber ser professor de arte junto a crianças.

Fonte: http://arteducacao.pro.br/Artigos/educativa.htm

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Sonhemos...


...façamos acontecer

Como Arte Educa?

Veja abaixo três frases que nos auxiliam para a resposta desta pergunta.

É preciso . . . rejeitar o modelo falsamente universal de uma compreensão de tipo intelectualista, que consiste num encadeamento de conceitos e que passa pelo filtro da linguagem, e introduzir a ideia de uma compreensão corporal e afetiva,fundada sobre analogias pessoalmente sentidas. Compreender com o próprio corpo tanto quanto com o espírito, eis uma situação original, que coloca problemas novos para a pedagogia. (Michel Tardy, O professor e as imagens, p. 93-94.)

É preciso compreender que a evolução estética não se refere apenas e necessariamente à arte; refere-se também à integração mais intensa e profunda do pensamento, do sentimento e da percepção. Pode, assim, suscitar maior sensibilidade em face da educação. (Lowenfeld e Brittain, Desenvolvimento da capacidade criadora, p. 398).

Onde palavra e som se combinam e soa o canto, a arte se revela, e cada cântico e cada livro, cada imagem, é uma descoberta — uma milésima tentativa de cumprimento da vida una. (Hermann Hesse)

terça-feira, 5 de maio de 2009

Macaco e Macarrão

Somente para os leitores do blog, revelo uma dinâmica/brincadeira/vivência chamem como queiram, o importante é fazer, crianças adoram. O seguinte é o que segue:
O comando é → macaco: os alunos sobem nas cadeiras ou onde quer que seja;
Macarrão: os alunos ficam grudadinhos igual a macarrão no meio da sala.
O legal é que como são palavras do mesmo prefixo, dá para fazer um certo mistério, por exemplo, falo maca...co ou maca...rrão, ou ainda, falo bem rápido macaco, macarrão, macaco, macarrão, macarrão. Sempre tem alguém que erra. Quando isto acontece peço para este que cante uma música ou imite um animal.

Em breve mais pérolas da arte-educação

domingo, 3 de maio de 2009

Romantismo


Em Cd, não temos o mesmo romantismo na hora de selecionar músicas e gravar para dar de presente.

sábado, 2 de maio de 2009

Planejamento do ensino em música




Quais são elementos presentes na música? Quais as formas de vivenciar a música? Como se aprende música? O que pretendemos com o ensino de música nas escolas? Quais são as nossas metas e objetivos? Por que ensinar música nas escolas?
Quando se escolhe começar um texto com perguntas, muitas das vezes, é porque seu autor não sabe como respondê-las, sendo que em todo o texto tais respostas podem ou não surgir, ou o que também é provável: depois de ler o texto redigido por tal autor, o leitor, cujo entendimento é sempre variável, ser mutante, acabar por ter mais dúvidas do que certezas. Pois bem, as perguntas com as quais comecei o texto, não são para serem respondidas de imediato, não precisa ser agora, mas é importante que comecemos a pensar nelas, e mais importante ainda: não se esquecer de tais indagações jamais. Pois estaremos falando de possibilidades ou dimensões das vivências a serem contempladas no planejamento do ensino da música. E, sinceramente não sei se você que está lendo este texto, que deve ser um educador musical, ou não, concluirá a leitura com as respostas que expus acima resolvidas. Saiba apenas que desde já existem várias possibilidades.
Para começarmos nossa busca por respostas podemos começar “ao planejarmos nossa prática docente, fazemos uma série de escolhas e precisamos estar conscientes delas e saber fundamentá-las”. Ou seja, primeiramente é importante sabermos quem somos e o que queremos da vida e conseqüentemente, quais são nossos objetivos como profissionais? “Para ensinar música, precisamos ter claro o que entendermos como sendo música, precisamos definir quais são os elementos ou dimensões que a constituem e quais são as formas de vivenciá-la”. Então é assim, definindo quais os conteúdos, num sentido mais amplo, definir como serão nossas aulas de música. Por exemplo, como podemos distinguir os elementos da música com elementos do som? Ora, o som é matéria-prima da música. Porém “é condição mínima, embora não suficiente, para que algo seja considerado música”. Os elementos do som são: altura, duração, intensidade e timbre. Organizando tais elementos, estamos começando a praticar a linguagem musical. E “é a intenção de fazer ou de ouvir música que nos permite diferenciar sons que constituem música daqueles que não constituem” .
Ao praticarmos música, seja ouvindo ou fazendo, estamos nos relacionando com os parâmetros do som de forma mais específica e subdivida: Intensidade passa a ser, por exemplo, forte, fraco, crescendo etc. Da mesma forma o timbre, que é uma voz humana ou instrumental única, uma qualidade, que só tal voz produz: cada ser-humano, tem um a voz única, que é também uma espécie de marca, assim como os instrumentos musicais. Só fagote tem o som do fagote, existem instrumentos que podem aproximar-se de sua sonoridade, mas como o fagote, só o fagote e assim para todos os outros instrumentos. Todos elementos predispostos e subdividos são ferramentas que podemos usar quando nos dispomos a compor, cantar, improvisar ou até mesmo ouvir vivenciando a música, tais ferramentas recebem, segundo Swanwick, a definição “materiais”. De tal modo que organizando estes materiais e observando como se desenvolvem e se contrastam em frases, períodos e partes é que começaremos a trabalhar também com expressão e forma. “Materiais, Expressão e Forma constituem um ponto de partida para definirmos os elementos musicais – ou, mais especificamente, os elementos sonoro-musicais – a ser contemplados em nossos planejamentos e desenvolvidos em nossas aulas”.
Não esqueçamos, porém, que toda esta vivência musical com todos os elementos que permeiam música perpassam por toda uma rede social, cheia de significados e funções, pois “é no mundo social que definimos e convencionamos o que consideramos música, quais a s formas de vivenciá-las e de aprendê-las e quais as funções e usos de determinada peça ou estilo musical. Portanto, a aula de música não pode tratar a música como um objeto destituído de significados e funções sociais.”
Precisamos então ser antes de tudo críticos, auto-críticos, no melhor sentido da apalavra, e tornar, aos poucos, nossos alunos também em críticos e auto-críticos, pois este não é um desafio apenas da disciplina música e sim, de toda a escola e toda a sociedade.
Sejamos então conscientes de nosso papel enquanto educadores, antes mesmo de educadores musicais, pois as perguntas do início do texto não precisam ser respondidas de imediato, não precisa ser agora, mas é importante que já comecemos a pensar nelas.
Quando tive conhecimento da sigla C. L. A. S. P. que para o português foi traduzida para T. E. C. L. A., criada por Keith Swanwick (FOTO), para mim foi como um achado de um tesouro, pois considero que a sigla traduz, quando estudamos o significado de cada letra da sigla o que precisamos estudar e fazer para sermos bons musicistas e/ou bons educadores musicais: Técnica, Execução, Composição, Literatura e Apreciação são também ferramentas que nos auxiliarão nas respostas da perguntas iniciáticas do texto.



Argentino Campos de Melo Neto

Poder e Administração no Capitalismo Contemporâneo


Resumo Analítico do Artigo de Lúcia Bruno intitulado
Poder e Administração no Capitalismo Contemporâneo

O artigo de Lúcia Bruno, intitulado Poder e Administração no Capitalismo Contemporâneo é esclarecedor, pois já no primeiro parágrafo ela expõe o objetivo do artigo que é apresentar um quadro referencial de análise que nos permita discutir as formas contemporâneas de organização e de exercício do poder, no interior das organizações, tendo como referência as teorias administrativas.
Desde os anos 60, o mundo vem se transformando, desenvolvendo-se organizacional e economicamente, tais ocorrências hoje são mais perceptíveis pois um processo econômico é lento e as organizações que participam deste processo habituam-se a uma espécie de jogo que só podem mudar com o surgimento de um novo jogo. Essa mudança de jogo é lenta porque quem joga é o mundo, é preciso então, que o mundo aprenda a jogar um novo jogo.
Estamos jogando a globalização, há algum tempo, no entanto, começamos a percebê-la à cerca de dez anos, especialmente com as ferramentas de comunicação de que hoje dispomos, neste ponto, o texto de Lúcia Bruno é indispensável para realmente entendermos o que se passa ao redor, além da tão falada globalização econômica, o texto nos esclarece a respeito da transnacionalização das estruturas de poder e a reestruturação produtiva.
São fenômenos novos de alguma forma, tendo em vista o início deste processo até os dias atuais, porém Bruno pontua a rapidez de movimentação deste processo e especialmente como isso é determinante em nossas vidas. Pra entendermos melhor a globalização econômica, é preciso que entendamos o início do capitalismo, que desde seus primórdios já prega a internacionalização do capital, já que este modo de produção nunca foi um sistema com características nacionais.
É a partir da Segunda Guerra Mundial que esse processo acelera-se, pois é quando, as empresas multinacionais – em sua grande maioria norte-americanas – começam a se expandir ultrapassando os territórios nacionais, daí os termos globalização e transnacionalização. Neste período o Estado-Nação começa a perder todo o poder de decisão, pois, esta nova forma já não se fundamenta na intervenção econômica dos governos e no seu inter-relacionamento. Isto acontece devido as empresas já se relacionarem diretamente sem a intervenção de um ou outro país e isso se dá, especialmente porque as empresas aceleram a concentração de capital, corroendo os sistemas econômicos cuja ordenação pressupunha a existência de poderes políticos nacionais ou plurinacionais, que tinham a capacidade de exercer ações de regulação macroeconômica. Então, podemos entender que a soberania do Estado nacional, a partir daí, não passa de demagogia política tendo em vista que as grandes empresas e governos não negociam em condições de igualdade.
As estruturas dos países são distintas, ao mesmo tempo em que as relações inter-organizacionais se estreitam, o que exige estudos mais específicos e aprofundados dos diferentes tipos de estrutura, ou seja, a prática da gestão torna-se ainda mais complexa, onde os conflitos e disputas exigem uma administração com propriedade, onde o que determina o processo econômico global é o aparecimento de novos pólos políticos de poder e do decisivo avanço dos gestores tecnocratas que controlam o capital.Daí importância conferida à capacidade adaptativa das organizações e aos processos de integração, mudança, conflito e consenso
Um outro fenômeno que ocorre nesta nova ordem mundial é que o poder de decisão pessoal, tende a desaparecer, ou seja, uma estrutura abstrata dita regras de funcionamento. O poder continua vertical, processando-se de cima para baixo, porém, as esferas articuladas se sobrepõem. As responsabilidades então pelas coisas sociais, como a desigualdade, que hoje já não é coisa apenas de terceiro mundo, expande-se pelo mundo afora sem que se aponte o responsável, este é um cenário onde todos obedecem a um sistema impessoal que funciona como uma espécie de regulador da autoridade. A sociedade contemporânea então, caminha pra instituições pluralistas, constituídas por diversos centros de autoridade que se equilibram mutuamente e se auto-regulam.
Cabe então, para nós educadores, a seguinte pergunta, qual é o papel da escola neste cenário? O artigo de Lúcia Bruno, mostra-nos alguns caminhos que podem revelar o sentido da educação dentro de um mundo cheio de contradições. É aí que a escola tem seu papel de reestruturação, embora se discuta bem mais sobre isso do que se faça realmente algo. A família, o meio social juntamente com a escola, precisam exercer sua função social, mais ainda que função, missão. Precisamos saber o porque que escolhemos a educação em nosso meio de trabalho, pois, a esfera ideológica assume grande importância enquanto elemento de coesão social. Para o mercado capital trata-se de uma mercadoria como outra qualquer e isso é uma das razões que provocam nos países uma certa correria para uma reestruturação. O que torna mais democrático o sistema educacional é promover formas consensuais de tomada de decisões. Uma contribuição que o artigo, que chega doer de tão triste é perceber que o Brasil segue fielmente a recomendação do Banco Mundial de investir mais em equipamento e meios físicos em detrimento do professor. Outra pergunta: Como é possível melhorar a qualidade do ensino sem investimentos de qualificação dos profissionais?























O universo das artes


O Universo das Artes (Resenha Crítica do capítulo "O universo das artes" no livro "Convite à Filosofia" de Marilena Chauí).


Eterno e Novo: Um.

Um vir a ser do que nunca existiu
como promessa infinita de acontecimentos

Marleau-Ponty


Alberto Caeiro é um dos heterônimos de Fernando Pessoa e é incrível como neste poema:
O meu olhar é nítido como um girassol
Tenho o Costume de andar pelas estradas
Olhando para direita e para esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo


podemos encontrar suficientes caminhos de descobrimento para significações da arte principalmente entendendo o olhar do artista que realmente nasce a cada momento, a cada criação; e este nascimento é para o momento, novo; ao mesmo tempo em que é, eterno. Fernando Pessoa criou vários personagens e este Alberto Caeiro nos mostra com sua filosofia simples que coisas aparentemente distintas caminham mais íntimas que possamos imaginar.
Ora se arte não é novidade/eternidade; eternidade/novidade? O artista a cada momento transforma-se, recicla-se sempre em busca do novo em si mesmo e essa busca é na verdade também em algo que existe desde sempre e que nunca deixará de existir, ou seja, é eterno. A autora exemplifica citando Monet que pinta a mesma catedral e na verdade a “mesma” não existe, pois a cada catedral pintada, uma nova catedral nasce e posso citar o poeta paraense Max Martins que hoje em dia já não mais cria ou cria muito pouco, porém, refaz, reescreve muito mais, conserta, reorganiza poemas outrora escritos.
Então podemos concluir que dentro da arte o eterno e o novo se fazem em um só e “o que há de espantoso nas artes é que elas realizam o desvendamento do mundo recriando o mundo noutra dimensão e de tal maneira que a realidade não está aquém e nem na obra, mas é a própria obra de arte”. O homem faz arte também no intuito de descobrir o mundo e o faz descobrindo a si mesmo. Se conhecer também é o caminho para a evolução.

Arte e Técnica

Ainda pouco vimos que eterno e novo são distintos e ao mesmo tempo semelhantes. Quando nos propomos a entender Arte e Técnica vimos também percebemos semelhanças e diferenças entre ambas. Podemos dizer que um médico tem a arte de curar, a arte médica e podemos ainda dizer que este médico é técnico em curar, a técnica médica, mas, examinado com mais cautela já percebemos alguma diferença: a minha impressão é que técnica é o aprofundamento da arte. O médico se forma em medicina e se especializa em algum ramo da medicina, ou seja, se especializa, se torna técnico em tal área. Na verdade nos dias atuais, muita coisa mudou não só quanto a esses termos, mas também como a arte médica, hoje, caminho para quem quer ter estabilidade no futuro sem muitas vezes, ter a capacidade médica, a arte médica, a técnica médica. O que pode nos auxiliar no entendimento é justamente ir de encontro às origens destas palavras, o que Marilena Chauí faz questão de esclarecer:
Ars: Arte em Latim que é correspondente ao termo grego techne que para nós significa técnica. No sentido lato, significa habilidade, desteridade, agilidade. Em sentido estrito, instrumento, ofício, ciência. Seu campo semântico se define por oposição ao acaso, ao espontâneo e ao natural. No sentido mais geral, arte é um conjunto de regras para dirigir uma atividade humana qualquer. É justamente por isso que citei o exemplo médico, mas poderíamos citar inúmeros como o faz Chauí: arte política, arte bélica. Retórica, lógica, poética etc. Porém podemos também examinar arte e técnica pelo viés da música. Ora, um músico pode ter a arte de tocar, mas pode não ter a técnica e do contrário também, neste caso, ocorre.
Platão não distinguia arte, ciências e filosofia, uma que estas são atividades regradas e ordenadas, como a arte o é. A divisão platônica “era feita de dois tipos: as judicativas, isto é, dedicadas apenas ao conhecimento, e as dispositivas ou imperativas, voltadas para a direção de uma atividade com base no conhecimento de suas regras”. O que percebemos é que há complementações nas idéias platônicas, pois Aristóteles já estabelece uma outra perspectiva que perdura durante muito tempo na cultura ocidental. Ciência-Filosofia distingue-se de arte ou técnica: “a primeira refere-se ao NECESSÁRIO, isto é, ao que não pode ser diferente do que é, enquanto a segunda se refere ao CONTINGENTE ou ao POSSÍVEL, portanto, ao que se pode ser diferente do que é. Outra distinção é feita no próprio campo do possível, pela diferença entre ação e fabricação, isto é, entre PRÁXIS e POIESIS. A política e a ética são ciência da ação enquanto artes ou técnicas são atividades de fabricação”.
Para completar a distinção Plotino separa teoria e prática e distingue também as técnicas ou artes cuja finalidade é auxiliar a natureza como medicina e agricultura daquelas cuja finalidade é fabricar como as matérias oferecidas pela natureza como o artesanato. Também as artes ou técnicas que não se relacionam diretamente com a natureza como música e retórica, por exemplo, que, tendo efeito principal no indivíduo tornando melhor ou pior.
O que nos chama atenção é que essa formação ou classificação da arte ou técnica venha se formar nas sociedades antigas, justamente nas sociedades em que não era valorizado o trabalho manual justamente por ser feito pela mão-de-obra escrava. Outro aspecto interessante é que para cada época da história humana, encontra-se uma divisão quanto às artes e/ou as técnicas. Por exemplo, até o século XV, as artes são divididas entre artes liberais (dignas de um homem livre) e servis ou mecânicas (própria do trabalhador manual).
Durante a Idade Média, Santo Tomás de Aquino justifica a diferença entre as artes que dirigem os trabalhos com a razão e as que dirigem os trabalhos com as mãos e assim, baseando-se nisso, institui que as artes liberais são: gramática, retórica, lógica, aritmética, geometria, astronomia, e música. Sendo artes mecânicas todas as atividades técnicas: medicina, arquitetura, agricultura, pintura, escultura, olaria, tecelagem etc. Ficam as perguntas: Um artista que usa as mãos não utiliza a razão e vice-versa? É interessante observar que nos dias atuais o termo profissional liberal é justamente o oposto do que era ser liberal Idade Média.
Na Renascença, porém, há uma busca pela valorização do trabalho manual, ou seja, pelas artes mecânicas que tinha até aquele momento um status diferente, inferior ao das artes liberais e esta valorização não passa de interesse econômico tendo em vista que o capitalismo começara a dar seus primeiros passos e as fontes e causas das riquezas vinham do trabalho manual. A primeira dignidade obtida pelas artes mecânicas foi sua elevação à condição de conhecimento, como as artes liberais. A segunda dignidade foi alcançada no final do século XII e a partir do século XIII, quando se distinguiram as finalidades das várias artes mecânicas, isto é, as que têm como fim o que é útil aos homens – medicina, agricultura, culinária, artesanato – e aquelas cujo fim é o BELO – pintura, escultura, arquitetura, poesia, música, teatro dança. Desse modo, com a idéia de beleza surgem as belas artes, modo pelo qual nos acostumamos a entender a arte. Daí em diante a distinção entre as artes acarretou uma separação entre técnica (o útil) e arte (o belo). O que criou uma forte imagem da sensibilidade e da fantasia do artista como gênio-criador. “Enquanto o técnico é visto como aplicador de regras e receitas vindas da tradição ou da ciência, o artista é visto como dotado de INSPIRAÇÂO, entendida como uma espécie de iluminação interior e espiritual misteriosa, que leva o gênio a criar a obra”.
Emmanuel Kant viria estudar amplamente o juízo de gosto, conceito que surgira a partir da conclusão de que a obra de arte é pensada a partir de sua finalidade – a criação do belo – onde podemos observar inseparável da figura do público (espectador, ouvinte, leitor), que julga e avalia o objeto artístico conforme tenha ou não realizado a beleza. E é justamente essas discussões do belo, da beleza, do gosto do público, do lado da obra, do gênio criador, inspiração que vêm ser os pilares da construção e uma disciplina filosófica: a estética. Todavia, desde o final do século XIX e durante o século XX, modificou-se a relação entre arte e técnica. Na verdade conceitos também mudaram e, por exemplo, técnica deu espaço à tecnologia e também por outro lado as artes passaram a ser concebidas menos como expressão genial misteriosa e mais como expressão criadora como transfiguração das possibilidades de cada linguagem artística como o movimento, do visível, do sonoro etc.
Para expressarem-se os artistas recorrem às técnicas, como sempre o fizeram
apesar daquela imagem de gênio criador inspirado, que tira de dentro de si a obra.

Arte e Religião

Historicamente, o trabalho e a religião desempenharam papéis fundamentais para humanidade no sentido de sua organização como sociedade, sendo que, o trabalho traz noções de vida em comunidade e a religião noções de autoridade esta sociabilidade proporcionada por ambos instituem também símbolos de organização quanto ao espaço/tempo, corpo/espírito. Com isso, as artes, tanto mecânicas quanto técnicas tornam-se inseparáveis do trabalho e da religião.
Na verdade essa relação com o sagrado que organiza o espaço e o tempo e ainda o sentimento da comunhão, também separa o Homem e Natureza e deles com o divino simbolizam o todo da realidade pela sacralização, ou seja, as atividades humanas assumem formas ritualísticas como, por exemplo, doença e cura, nascimento e morte, mudança de estações, a semeadura e a colheita, a passagem do dia à noite etc.
Por muito tempo então, se têm arte como atividades técnico-religiosas, pois pintar, edificar, cozinhar, caçar, plantar, assumem as mesmas características de ritos, sendo assim, tidas como iguais tendo em vista que o trabalho e a religião tendem sacralizar e ritualizar a vida. Serão ainda necessários alguns anos e profundas transformações histórico-sociais para as belas artes, como hoje conhecemos, tornarem-se independentes, dotadas de valor, autonomia e significações próprias.
O interessante é que antes de acontecer de fato, esta “emancipação” das linguagens, os artistas eram tidos também como “magos”, devido o conhecimento em diversas áreas como nas combinações médico/astrólogo/músico ou arquiteto/dançarino/escultor – tão raras quanto atuais – pois eram iniciados em mistérios, ou seja, em um rito sagrado. Aprendia-se a conhecer a matéria prima para uma determinada arte e manusear os instrumentos necessários para sua criação. A dimensão religiosa das artes deu objetos artísticos ou às obras de arte uma qualidade que foi estudada pelo filósofo alemão Walter Benjamim: a aura. Mas o que é a aura?
“A aura é a absoluta singularidade de um ser – natural ou artístico –, sua qualidade de eternidade e fugacidade simultâneas, seu pertencimento necessário ao contexto onde se encontra e sua autenticidade, o vínculo interno entre unidade e durabilidade. Única, uma, irrepetível, duradoura e efêmera, aqui-agora e parte de uma tradição, autêntica: a obra de arte aurática é aquela que torna distante o que está perto, porque transfigura a realidade, dando-lhe a qualidade da transcendência”. O que mais fascina na obra de Walter Benjamim é sua capacidade de exemplificar de maneira simples, suas idéias. Em seu ensaio intitulado “A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica” escreve: “Em suma, o que é a aura? É uma figura singular, composta de elementos especiais e temporais: a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja. Observar, em repouso, numa tarde de verão, uma cadeia de montanhas no horizonte, ou um galho, que projeta sua sombra sobre nós, significa respirar a aura dessas montanhas, desse galho”. Na verdade voltamos ao início quando vimos na unidade do eterno e do novo, pois a aura é também o momento que é singular, é novo e é eterno.
Marilena Chauí conclui o texto complementando e esclarecendo e justificando o fato de o artista ser considerado, outrora, como gênio criador, mágico. Justamente por entender-se que as significações e características de arte em cada momento histórico não tiram sua essência, que é a capacidade e a possibilidade de criação e interpretação: “Passando do divino ao belo, as artes não perderam o que a religião lhes dera: a aura. Não por acaso, o artista foi visto como gênio criador inspirado, indivíduo excepcional que cria uma obra excepcional, isto é, manteve em sua figura o mistério do mágico antigo”.



Arte e Filosofia
Poética e Estética. É o que separa em momentos pelo qual a filosofia teorizou e buscou compreender a arte racionalmente. No primeiro momento inaugurado por Platão e Aristóteles, onde tratam as artes sob a forma da poética. Na obra aristotélica Arte Poética o pensador grego trata das artes da fala e da escrita, do canto e da dança: a poesia e o teatro (tragédia e comédia). A palavra poética é a tradução de poiesis, portanto, para a fabricação. A arte poética estuda as obras de arte como fabricação de seres e gestos artificiais, isto é, produzido pelos seres humanos.
No segundo momento conhecemos Estética, termo utilizado pela primeira vez – para referir-se às artes quanto ao estudo das obras enquanto criações da sensibilidade, tendo como finalidade o belo – por Alexander Baumgarten por volta de 1750 que vem do grego aesthesis, que significa conhecimento sensorial, experiência, sensibilidade. A Estética pouco a pouco substitui a noção de arte Poética e passa a designar toda a investigação filosófica que tenha por objeto as artes, uma arte ou ainda, determinadas obras de arte. Do lado do artista e da obra, busca-se a realização da beleza; do lado do espectador e receptor, busca-se a reação sob a forma do juízo de gosto, do bom gosto.
A noção de estética, quando formulada e desenvolvida nos séculos XVIII e XIX, pressupunha:
1 – que a arte é produto da sensibilidade, da imaginação e da inspiração do artista e que sua finalidade é a contemplação;
2 – que a contemplação, do lado do artista, é a busca do belo (e não do útil, nem do agradável ou prazeroso) e, do lado do público, é a avaliação ou o julgamento do valor de beleza atingido pela obra;
3 – que o belo é diferente do verdadeiro.

Relação entre arte e natureza
A arte é mimésis, ou seja, imitação. “A arte imita a natureza” defende Aristóteles e segundo o que escreve o pensador, resulta da atividade do artista imitar outros seres por meio de imagens, sons, cores, formas, volumes etc., e o valor da obra decorre da habilidade do artista para encontrar materiais e formas adequados para obter o efeito imitativo.
O que na verdade não podemos confundir é imitação com reprodução, pois há uma linha, ainda que tênue, que separa as duas. Imitar mais assemelha então a representar a realidade para que “a obra figure algum ser (natural ou sobrenatural), algum sentimento ou emoção, algum fato (acontecido ou inventado). Harmonia e proporção das formas, dos ritmos, das cores, das palavras ou dos sons oferecem a finalidade a ser alcançada e estabelecem as regras a serem seguidas”.
A partir do romantismo (portanto, após quase 23 séculos de definição de arte como imitação), a filosofia passa definir obra de arte como criação. E a idéia de inspiração torna explicadora da atividade artística. A terceira concepção, mais contemporânea, vê a arte como expressão e construção. “A obra de arte não é pura receptividade imitativa ou reprodutiva, nem pura criatividade espontânea e livre, mas expressão de um sentido novo, escondido no mundo, eu um processo de construção do objeto artístico, em que o artista colabora com a natureza, luta com ela ou contra ela, separa-se dela ou volta a ela, vence a resistência dela ou dobra-se às exigências dela”. Essa concepção corresponde ao momento da sociedade ao momento da sociedade industrial, da técnica transformada em tecnologia e da ciência como construção rigorosa do real. “Arte é trabalho da expressão que constrói um sentido novo (a obra) e o institui como parte da cultura”.
O artista é um ser social que reflete na sociedade, para a sociedade, pela sociedade seja para criticá-la, para afirmá-la ou ainda para superá-la e o faz exprimindo-se, expressando-se, comunicando-se através de seu modo de estar no mundo na companhia de outros seres humanos.

Relação entre arte e humano
Também é na Grécia que iniciam as discussões referentes à relação entre o humano/arte/humano. Platão considera a arte conhecimento e essa concepção logo vem ser alterada por Aristóteles, que também sofrerá mudanças no decorrer da história, que considera a arte como atividade prática. Para Platão a arte está no mundo mais baixo do conhecimento, pois, considera imitação das coisas sensíveis sendo elas próprias imitações imperfeitas. Na Renascença, porém, o conceito de Platão volta à tona, mas com um novo sentido: e o que é afirmado então é que a “a arte uma forma alta de acesso ao conhecimento ficando abaixo apenas da filosofia e do êxtase místico”. Essa mudança se deve principalmente porque na Renascença redescobrem-se os escritos Hermético em que diz que o Deus criou o Homem dotado de criatividade o que lhe dá acesso ao conhecimento das formas secretas das coisas. E é justamente no Romantismo é que a arte como expressão encontra seu apogeu quando é concebida como o “órgão geral da filosofia”, sob três aspectos diferentes: para alguns, a arte é a única via de acesso ao universal e ao absoluto; para outros, como Hegel, as artes são a primeira etapa da vida consciente do Espírito, preparando a religião e a filosofia; e outros, enfim, a concebem como o único caminha para reatar o singular e o universal, o particular e o geral, pois, através da singularidade de uma obra artística, temos acesso ao significado universal de alguma realidade. Essa última perspectiva é a que encontramos, por exemplo, no filósofo Martin Heidegger, para quem a obra de arte é desvelamento e desvendamento da verdade.

Funalidades-funções da arte
Na história das artes nos deparamos com duas concepções ligadas às finalidades artística: a concepção pedagógica e a expressiva. Novamente, porém, vamos encontrar raízes profundas na Grécia Antiga onde Platão e Aristóteles encontram formulações: Platão, na República defende que a cidade perfeita é aquela onde são excluídos poetas, pintores e escultores porque “imitam as coisas sensíveis e oferecem uma imagem desrespeitosas dos deuses, tomados pelas paixões humanas;porém, coloca dança e música como disciplinas fundamentais na formação do corpo e da alma”. Aristóteles, na Arte poética, desenvolve de maneira aprofundada o papel pedagógico das artes onde especialmente a tragédia que segundo o filósofo, tem a função de produzir a catarse, ou seja, a purificação espiritual dos espectadores além de proporcionar a comoção e o horror. Essa função catártica é atribuída sobretudo à música. Na Arte poética Aristóteles escreve: A música não deve ser praticada por um só tipo de benefício que dela pode derivar, mas por usos múltiplos, já que pode servir para a educação, para proporcionar a catarse e, em terceiro lugar, para o repouso da alma e a suspensão de sua fadigas. A autora faz então uma ligação entre Aristóteles e Shakespeare quando lemos em O mercador de Veneza ouvimos, segundo Chauí, o ecoar das palavras do filósofo grego:
Todo homem que em si não traga a música
E a quem não toquem doces sons concordes,
É de traições, pilhagens,armadilhas.
Seu espírito vive em noite obscura,
Seus afetos são negros como o Érebo:
Não se confie em homem tal...
A concepção pedagógica da arte reaparece em Kant quando afirma que “a função mais alta da arte é produzir o sentimento do sublime”

Arte e sociedade
As mudanças ou transformações sofridas pelas artes se vistas de maneira mais cuidadosa e atenciosa, mostram que na verdade essas mudanças/transformações, ocorrem apenas de dois tipos: as alterações quanto ao fazer artístico diferenciando-se em escolas de arte conhecidas também como estilos artísticos como pro exemplo o barroco, clássico, romântico, impressionista, futurista, surrealista etc.
As primeiras discussões sobre arte e sociedade trouxeram duas vertentes filosóficas opostas: a primeira afirma que arte só arte se for pura, ou seja, se não estiver compromissada com interesses de outras naturezas que não sejam artísticos como a política, a economia, a história. Trata-se portanto da defesa da “arte pela arte”. A outra vertente defende uma arte engajada, na qual o artista toma posição diante da sociedade e encara o seu ofício como maneira prática de lutar em benefício da sociedade auxiliando na transformação e melhoria da realidade.

Argentino Campos de Melo Neto.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

CRISE E TRANSFORMAÇÃO: UM CAMINHO MUTACIONAL


CRISE E TRANSFORMAÇÃO: UM CAMINHO MUTACIONAL
Argentino Neto*
Referência: NETO, Argentino. Crise e Transformação: um caminho mutacional. UEPA. 2008.
Resumo: O presente artigo pretende fazer uma breve análise do Filme “Ponto de Mutação”, mais na sua essência filosófica do que em sua estética cinematográfica. A idéia é explorar a teoria do filme, inspirada no livro homônimo de Fritjof Capra, trazendo para discussão a crise existencial da humanidade, com um enfoque educacional, ou seja, diante da realidade, examinar o papel da educação. Diante da crise, a necessária transformação, um caminho mutacional.
Palavras-chave: Artigo. Crise. Transformação. Ponto de Mutação. Educação.

"Se as portas da percepção estivessem limpas, tudo apareceria para o homem tal como é: infinito.”
William Blake

Se queremos entender a crise que hoje estamos vivendo, o livro de Fritjof Capra intitulado O Ponto de Mutação, que deu origem às idéias do filme homônimo de Bernt Capra, nos oferece elementos fundamentais, mas não só isso, oferece também o que é mais importante, a oportunidade de vislumbrar possíveis soluções para a tal crise, através de transformações que a própria crise revela.
Diante disso, cabe a nós, primeiramente, termos a compreensão da crise e das transformações advindas, para que possamos, aceitando-as, transformar nossas ações de modo benéfico.
A crise, segundo Capra, já não é apenas uma crise de indivíduos, governos ou instituições sociais; é uma transição de dimensões planetárias. Como indivíduos, como sociedade, como civilização e como ecossistema planetário, estamos chegando a um momento decisivo¹.
Sobre a transformação em nosso planeta, diz: a transformação que estamos vivenciando agora poderá muito bem ser mais dramática do que qualquer das precedentes, porque o ritmo de mudança em nosso tempo é mais célere do que no passado, porque as mudanças são mais amplas, envolvendo o globo inteiro, e porque várias transições importantes estão coincidindo².
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*Argentino Neto é Músico e Arte-educador e Graduando em Licenciatura Plena em Música pela Universidade do Estado do Pará.
1: Fritjof Capra. Ponto de Mutação, p. 23.
2: Fritjof Capra. Ponto de Mutação, p. 23.

Buscamos também conhecer os significados de tais palavras com o auxílio do dicionário. A palavra Crise, do latim, krísis, quer dizer: estado de dúvidas e incertezas; fase difícil, grave, na evolução das coisas, dos fatos, das idéias; tensão e conflito. A palavra Transformação: do latim, transformatione, que tem a seguinte definição:
modificação do estado de um sistema.
Através destes significados podemos enfatizar a crise como um estado difícil, de dúvidas e incertezas, mas que também aponta um caminho, uma possibilidade de transpassar o estado de crise, através do exame das condições originais da crise, pode vir a transformação, motivada pela própria busca da felicidade que está em todos nós. Portanto, podemos compreender crise e transformação enquanto coisas interligadas.
O professor Benedito Nunes, quando escreveu o prefácio da Antologia Poética de Max Martins, cita a crise enquanto processo criativo, chamando-a de “o processo de cada livro do poeta”. Por exemplo, “a incorporação do espaço como distribuidor de ritmo e revelador visual do significado, o poema passando à categoria de composição topográfica inclusiva de um desenho letrista, icônico, adviria na terceira crise, encetada em H’Era (1971) e resolvida em O OVO FILOSÓFICO (1975), que precedeu O RISCO SUBSCRITO (1976), culminância desse período”.
No texto do professor Bené, como é carinhosamente chamado por seus admiradores, a terceira crise quer dizer o que gerou o processo criativo, que pode ser uma convivência com um novo amigo, ou uma leitura, é um aspecto diferente de crise, porém, podemos ver que também diante deste tipo de crise, seu resultado é pela transformação de algo ou em algo, que neste caso, são os próprios poemas de Max Martins, que dispensam maiores comentários.
O filme Ponto de Mutação nos leva a refletir algumas questões, que perpassam toda humanidade, qualquer indivíduo, um dia se faz tais indagações. No Tibet, os monges budistas, como parte de suas meditações diárias reservam um destes questionamentos: O que estou fazendo de minha vida, qual o papel da existência humana no planeta. Na África, segundo o etnomusicólogo Kazadi Wa Mukuna, tudo que permeia a vida social é indicada através de uma frase simples, mas de significado profundo: Pertenço, logo existo. Ou seja, para existir preciso pertencer: à minha família, meu Estado, meu País, etc. Tal raciocínio é diferente do clássico cartesiano: “Penso, logo existo”, pois, antes de pensar, já existo, porque pertenço. Talvez entendendo o significado dessa frase, compreenderemos não só um continente, tão complexo como a África, mas, o verdadeiro significado da existência humana, a vida.
Compreensão. Percepção. É disso que precisamos. Segundo o filme, e consequentemente o livro, Ponto de Mutação, o mundo passa por uma crise de percepção, tal crise não nos deixa enxergar o que está bem diante de nossos olhos, é que vemos o mundo de forma desintegrada, fragmentada, esquecendo de que tudo está conectado. Para debater tais questões, no filme encontramos três personagens distintos em áreas de atuações, mas, representativos, em termos de classes, na sociedade: um poeta, um político e uma cientista. E, tanto no livro quanto no filme, encontramos uma abordagem poética, científica e política. A poética é toda baseada numa sabedoria milenar chinesa: o oráculo I ching, mas presisamente no Hexagrama de n° 24, O retorno também conhecido como o livro das mutações encontramos, uma ótima significação de crise e transformação: Ao término de um período de decadência sobre vêm o ponto de mutação. A luz poderosa que fora banida ressurge. Há movimento, mas este não é gerado pela força... O movimento é natural, surge espontaneamente. Por essa razão, a transformação do antigo torna-se fácil. O velho é descartado, e o novo ê introduzido. Ambas as medidas se harmonizam com o tempo, não resultando daí, portanto, nenhum dano.
A abordagem científica é toda baseada pela vivência de Capra, já que ele é PhD em física quântica, com pesquisas em Teoria de Sistemas Complexos. Capra numa entrevista de 30 de janeiro de 2003 é perguntado sobre o porquê um PhD em física quântica decidiu pesquisar ecologia e escrever livros como O Tao da Física, Ponto de Mutação e Teia da Vida? No que respondeu: - Isso tem acontecido com freqüência. Sou parte de uma geração que criou uma grande rede de educadores ambientais e de militantes da mudança social. A maior parte de meus companheiros tiveram duas ou três profissões antes de se dedicarem a esse trabalho atual. É sinal dos tempos. Acredito também que deve haver uma influência da minha juventude. Passei meus primeiros anos numa fazenda, na Áustria, em um ambiente bem rural. Eu, meus irmãos e meus primos trabalhávamos na fazenda e tínhamos de caminhar quatro quilômetros para tomar um trem e chegar à escola de segundo grau. É interessante que hoje consigo desenhar mentalmente um mapa daquela fazenda. E apesar de isso ter se passado há quarenta anos, recordo-me como se fosse hoje a posição de cada árvore, de cada plantação de morangos e de batatas. Isso está marcado profundamente em minha memória. Ou seja: meu amor pela ecologia começou bem cedo, na infância. Na mesma entrevista, Capra se diz abismado e perplexo de ver como as idéias do livro escritas na década de 80, até hoje são discutidas inclusive nas reuniões da ONU, o que mostra que pouca coisa mudou: - Estamos no mesmo ponto em que estávamos no final os anos 80. E o que aconteceu desde aquela época? A revolução tecnológica. Houve tremendos avanços que produziram entusiasmo e esquecimento de outras coisas fundamentais, ao mesmo tempo em que se criou uma verdadeira fé no capitalismo global, que é extremamente destrutivo.
Então a abordagem política presente no filme é transcendente, é inspirada numa nova concepção de mundo, uma concepção política mais perto da realidade, uma política que atenda realmente os anseios das pessoas, nas questões mais amplas, ou seja, as questões políticas debatidas no livro e no filme ultrapassam os limites corriqueiros, não se discute no filme se o Presidente de uma Nação deve ou não, distribuir no seu sistema social, dinheiro ou mesmo alimentação aos mais pobres. E ainda mais que isso, encontramos propostas de extinção da fome no mundo. Encontramos também a reeducação alimentar, como solução para o desmatamento na Amazônia e conseqüentemente, a diminuição de problemas cardiovasculares e cardiorrespiratórios.
Mas então, isso não seria um absurdo? Como podemos citar a reeducação alimentar como solução para o desmatamento? Ou, o que o desmatamento tem haver com os problemas do coração? A resposta: tudo. Tudo isto está interligado através de uma teia de relações. Todas as ações sejam elas as menores, como um simples caminhar, respirar ou falar, no universo tem uma conseqüência. A partir deste pensamento, deveríamos nos preocupar mais, quando jogamos lixo em via pública e mais, quando não reutilizamos, nem reciclamos e muito menos reduzimos o lixo que produzimos. Deveríamos nos preocupar com a nossa alimentação, será que precisamos comer carne bovina com tanta freqüência? Porque o desmatamento é acelerado quando comemos carne em demasia? Simples: o gado para ser criado precisa de pasto, e onde encontramos terra em demasia é no norte do País, na Amazônia, porém, nas terras amazônicas, encontramos vida em abundância, biodiversidade encontrada essencialmente na floresta, quando um criador de gado derruba árvores para fazer um pasto, derruba com elas todo um ecossistema. Repito, tudo está interligado, se pensarmos numa esfera mais ampla, especialmente espiritual, sentiremos com naturalidade que até nossos pensamentos, tem um resultado na natureza, uma conseqüência no universo.
Tendemos, principalmente nos dias atuais, muito mais a separar do que unir, tornamo-nos individualistas e conseqüentemente egoístas, com o passar do tempo. Vemos então, na educação um belo exemplo de desintegração: as disciplinas que compõem um currículo educacional, são todas interligadas, porém, os professores geralmente, institucionalizam e departamentalizam suas disciplinas, de forma que, o professor de matemática, ministra sua disciplina sem se dar conta que o caminho matemático é facilmente percebido, em outras áreas do conhecimento e vice-versa. Em um mundo globalizado então, a interdisciplinaridade é o que mais viabiliza a compreensão do todo em termos educacionais. Quando percebermos que todas as áreas do conhecimento são igualmente importantes, que todas elas estão interligadas, veremos também a educação de forma diferenciada, pois a educação também vive uma crise, especialmente nos países subdesenvolvidos.
Cabe então, para nós educadores, a seguinte pergunta, qual é o papel da escola neste cenário? O filme e o Livro, mostram-nos alguns caminhos que podem revelar o sentido da educação dentro de um mundo cheio de contradições. É aí que a escola tem seu papel de reestruturação, embora se discuta bem mais sobre isso do que se faça realmente algo. A família, o meio social juntamente com a escola, precisam exercer sua função social, mais ainda que função, missão. Precisamos saber o porque que escolhemos da educação o nosso meio de trabalho, pois, a esfera ideológica assume grande importância enquanto elemento de coesão social. Para o mercado capital trata-se de uma mercadoria como outra qualquer e isso é uma das razões que provocam nos países uma certa correria para uma reestruturação. O que torna mais democrático o sistema educacional é promover formas consensuais de tomada de decisões.
Sem sombra de dúvidas os Capra, Fritjof e Bernt, respectivamente pai e filho, trazem para as pessoas duas obras de sensibilidade e reflexão sobre a existência humana, num contexto de desenvolvimento e evolução, buscando um equilíbrio especialmente nas idéias de sustentabilidade.
Assistindo o filme vemos os três personagens conversando e percebemos que cada um em seu universo contribui para a compreensão das idéias do livro, o político (claramente inspirado em Al Gore) e o poeta, amigos, estão em busca de uma compreensão da vida, ou ao menos, em busca de algo que os leve a uma compreensão. O terceiro personagem, a física, busca um caminho diferente: se transformar no isolamento, na fuga. É que percebe, frustrada os resultados de suas ações e criações. Através dos longos diálogos dos três personagens claramente percebemos alguma solução para um futuro mais promissor para a raça humana, que no filme chamam de raciocínio ecológico, o em contraponto ao pensamento cartesiano clássico, pensando em um mundo de recursos exauríveis, orgânicos e espirituais, sejam da natureza ou da capacidade de absorver as injustiças sociais.Todas estas questões são dificilmente ainda compreendias justamente pela crise de percepção, pois, quando abrirmos as portas das percepções, o mundo se mostrará tal como é: infinito.
E, o princípio disto é ver o todo, entendo sua conexão de fracioná-lo, percebendo a interatividade e a integração. Nossa existência gera um impacto global, nunca esquecendo que vivemos ciclos contínuos, renovação e ainda independentemente de nossas ações, nosso planeta flui em um processo vivo, se adaptando, transcendendo, progredindo, transgredindo padrões, evoluindo. Por isso evoluímos não só no planeta, mas com o Planeta.
“Um lugar tão grande serve para mostrar o quanto somos pequenos”.














Argentino Campos de Melo Neto




Referências bibliográficas
ARANTES, Cléber Agnaldo. Ponto de Mutação. Disponível em Acesso em 21 ago. 2008.
EcoAgência de Notícias. O ponto de mutação já passou - entrevista com Fritjof Capra. 30 de janeiro de 2003 concedida a Carlos Tautz. Disponível em http://www.agirazul.com.br/fsm4/_fsm/00000098.htm > Acesso em 20 ago. 2008.
BELOTE, Ernesto. O Ponto de Mutação. Disponível em . Acesso em 21 ago. 2008.

BRUNO, Lúcia. Poder e administração no Capitalismo Contemporâneo.

MARTINS, Max. Poemas Reunidos. Belém. EDUFPA.2001.

CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação, Ed. Cultrix, 1992.


Filmografia

O Ponto de Mutação. Direção: Bernt Capra.

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Argentino Campos de Melo Neto